Marcos Alves

Carlos Goulart chega ao recinto onde está acontecendo o velório de sua mãe, a senhora Eusébia Alves, muito mais conhecida como Kelly. O órfão se surpreende com o número de pessoas no velório. Sua mãe morreu porque foi assassinada em meio a um desentendimento com um de seus clientes bêbados, trabalhar como prostituta é muito perigoso. A mulher levou a vida sendo uma prostituta desde antes de atingir idade suficiente para dirigir um automóvel.

É uma pena vê-la deitada no caixão, mas se surpreende ao notar que ela não estava com um barrigão, sua mãe quase sempre estava grávida de um filho que teve com algum cliente. Kelly sempre esbanjou um alto número de clientes, ela possuía dois diferenciais em comparação às outras prostitutas: nunca usava camisinha e quase sempre estava grávida. Carlos acha repugnante tantos homens terem o fetiche de se relacionar com uma prostituta grávida, mas não pode negar que isso rendeu muito dinheiro para sua mãe e ele a admira, pois ao seu ver, se deu muito dinheiro valeu a pena.

Um grande burburinho surge quando entra uma ilustre personalidade no velório e Carlos se surpreende quando avista o homem famoso se aproximando do caixão. Chega ao lado do cadáver José Maria Marin, um dos dirigentes da FIFA, chorando muito alto ao ver o corpo de Kelly deitado. Carlos não entende o porquê de José Maria Marin a prantear, fica curioso para saber o que faz o Vice-presidente da CBF sentir tanto pela vida da prostituta.

– Olá, você está bem? Meu nome é Carlos Goulart. Eu não te conheço muito bem, mas sou filho da Kelly e fico feliz de saber que minha mãe tinha alguém que gostava tanto dela.

– Você também é filho da Kelly? – Marin para de chorar por estar muito surpreso.

– Como assim “você também”? – Carlos está ainda mais espantado.

– Kelly é minha mãe! Não sabia que eu tinha um irmão chamado Carlos.

– Isso é uma surpresa para mim também, pode ter certeza! Um pobre coitado como eu ser irmão de um dos grandes organizadores da copa do mundo no Brasil!

– Prazer em te conhecer meu irmão. E o que você faz da vida?

– Eu sou gerente em uma empresa de peqeuno porte, acabei chegando atrasado aqui no velório porque eu estava cheio de afazeres no trabalho. Eu vou te confessar que não sou exatamente a pessoa mais competente do mundo, acabei deixando alguns serviços urgentes parados… Mas mãe é mãe, eu tinha de vir para cá, sabe como é.

– Com certeza, mãe é mãe. Mas me diz uma coisa, você ganha bem sendo gerente de uma empresa de pequeno porte?

– Ganho muito bem. – Carlos faz questão de parecer bem sucedido diante de Marin. – Eu não costumo contar isso para ninguém, mas vou confiar em você que é meu irmão. Eu sou um laranja na empresa que trabalho. O presidente confia muito em mim e eu sou parte fundamental no esquema dele para deixar de pagar impostos.

– Fala baixo, hoje em dia não se pode confiar em ninguém. Mas foi um prazer te conhecer.

– Marin, o prazer foi meu.

– Aliás, falando em conhecer os irmãos, você conhece o que está chegando agora?

José Sarney Adentra no velório trajando um terno preto que demonstra seu luto, cumprimentando a todos no lugar.

– José Sarney é nosso irmão também?! – Carlos desacredita.

– Sim, ele é. Sua família está repleta de pessoas importantes. – Marin complementa.

– Que orgulho, Kelly foi praticamente uma galinha que bota ovos de ouro.

Os filhos da prostituta Kelly confraternizam em meio ao luto. Quando Carlos decide finalmente ir embora, vê que em frente ao cemitério há um jato particular estacionado, cercado por centenas de pessoas. O gerente nunca viu um jato com os seus próprios olhos, mas maior ainda é sua surpresa ao ver que descem do jato Dilma Rousseff e Aécio Neves. Carlos pede uma explicação para um sujeito que está ao seu lado sobre o que está acontecendo.

– O que Dilma Rousseff e Aécio Neves estão fazendo aqui neste cemitério? – Carlos já suspeita da resposta, mas quer confirmar.

– Os meus irmãos vieram prestar homenagem à prostituta Kelly, nossa mãe que faleceu.

– Seus irmãos?! E quem é você? – A prostituta Kelly teve muito mais filhos do que Carlos podia imaginar.

– Meu nome é Marcelo Amorim, sou um jornalista que distorce algumas notícias para beneficiar os meus irmãos, pois nós que somos do mesmo sangue temos de trabalhar juntos.

– E você sabe por que a Dilma Rousseff e o Aécio Neves estão vindo juntos?

– Quando perguntaram isso para a Dilma Rousseff ela alegou que apenas subiu no avião e não sabia que Aécio Neves estava lá dentro, embora o seja o avião particular do Aécio Neves. Há especulações que deve ser porque o preço do combustível de jato aumentou, além de que era mais prático para os dois viajarem na aeronave do Aécio porque essa já estava no aeroporto que se localiza ao lado da casa da família Neves.

– Muito mais prático mesmo.

Ao se virar para andar até o estacionamento, Carlos se depara com uma cena arcaica que parecia ser uma encenação dos tempos do antigo Egito. O bispo Edir Macedo está sentado em um trono de ouro que é arduamente carregado por seis fiéis de sua igreja. Em vez de sentir pena dos seis fiéis com roupas rasgadas, Carlos admira a ostentação do trono de ouro onde Edir Macedo repousa.

– Vão mais rápido, eu já estou atrasado para o velório de mamãe, já estou achando que vou chegar somente para o enterro. – Edir Macedo grita alto para os seus fiéis.

Carlos não se impressiona mais, não é necessário perguntar para o bispo se ele também é filho da prostituta Kelly, a resposta é óbvia. Ao se afastar da casa onde ocorre o velório de sua mãe Carlos vê uma cena intrigante. Centenas de milhões de pessoas estão no cemitério no que se assemelha a um grande movimento. “Todos estes são meus irmãos também?” Carlos pergunta para si mesmo e puxa pelo braço uma mulher no meio dessa multidão para perguntar.

– Não toque em mim. – A mulher olha para Carlos com muito ódio.

– Você está brava comigo? – Carlos não sabe o que fez para a mulher.

– Claro que sim, você matou a minha mãe.

– Não, quem matou a Kelly foi um dos clientes dela, não fui eu.

– Kelly é sua mãe, não a minha. Todas essas milhões de pessoas que estão comigo estão aqui para o enterro de minha mãe, que você e seus irmãos mataram.

– Eu matei? – Carlos sente medo da multidão com centenas de milhões de pessoas. – Você é filha de quem?

– Eu sou uma filha da Pátria.

MARCOS ALVES